domingo, 26 de abril de 2015

O Miniaturista, de Jessie Burton

Este é um dos livros pelo qual eu estava mais esperava, com curiosidade e expectativa, achando que ia encontrar uma obra cheia de suspense e mistério, devido à sinopse e a alguns comentários internacionais. Pois bem, enganei-me, até certo ponto. Não há terror, mas há uma história muito humana e bastante misteriosa, não em termos sobrenaturais, mas em termos sociais. É um retrato de uma sociedade, de uma época, é uma história com imensa realidade, muito bem escrita, que mostra a vida de uma família através de um olhar misterioso e diferente. Acabei por encontrar não o que estava à espera, mas algo fascinante e belo, bastante forte.


Sinopse:

No ano de 1686, depois de casar, a jovem Petronella Oortman deixa a sua casa e a sua família no campo e parte para a casa do seu esposo, Johannes Brandt, um mercador de sucesso, em Amesterdão, na parte mais rica da cidade. A pensar numa vida romântica e em mil maravilhas da vida de casada, Nella cedo descobre que nada é como esperava e encontra uma casa não muito acolhedora, com uma cunhada fria e distante. Assim, a única coisa que a anima na sua nova situação é a prenda do seu marido: uma casa de bonecas maravilhosa. Nella descobre um miniaturista para criar objectos e bonecas para a sua casinha e começa a montar a sua casa, uma réplica perfeita da sua nova casa. O que ela não sabia é que os bonecos e objectos começam a chegar sem serem pedidos, mostrando-se como algo sinistro quando começam a ser um prenúncio de certos acontecimentos e quando começam a representar a sua vida na perfeição, sem Nella ter dado a conhecer nada dela ao miniaturista. 

Nella vê-se rodeada de um mistério incapaz de resolver e da sua nova família estranha, cujos segredos são mais do que muitos, capazes de os afundar a todos.

Opinião:

Encontrei neste livro uma história sem igual.Tanto em termos narrativos, como da própria escrita da autora, que é bastante peculiar, passando pelas personagens e pela forma como estas abordam as suas questões. É uma história muito bonita, que começa numa cadência não muito rápida e que vai ascendendo até se ouvirem os tambores a rufar, como que em apoteose. A história quase que termina no seu auge, deixando uma réstia de nostalgia e espanto ao terminar de forma tão brusca, num momento tão decisivo. Fiquei a olhar para a última página, dando por mim a pensar "Já está? E mais?". Mas, no fundo, sei que terminou no momento certo. Não há necessidade de mais nada, porque o que lá está basta para mostrar as sombras da sociedade, os segredos que se tornam em tragédias e a hipocrisia que envolve todas as pessoas e todo o ambiente.

É aqui revelado uma parte da história da Holanda, que tanta história tem para oferecer e que nem sempre aparece como podia aparecer. Fiquei a conhecer vários aspectos históricos de Amesterdão, bem como questões sobre os mercadores e a sua forma de vida, e ainda alguns termos utilizados no dia a dia. A autora fez um trabalho notável, em todos os níveis, incluindo a nível histórico. Está tudo muito coerente e os apêndices estão muito bem empregues.

Gostei de como a autora abordou temas que na altura eram um escândalo (e que talvez ainda hoje, para alguns, o sejam...digo talvez como um eufemismo...), e como os misturou com algo cheio de mistério como é o facto do miniaturista e da sua capacidade de conhecer os seus clientes melhor do que eles mesmos se conhecem. Aliás, a forma como esta personagem entra na história, como paira sobre as personagens e como a trama se enreda à volta dela, está imensamente bem elaborada e é o ponto fulcral. Todo o mistério que cerca a personagem está muito bem construído e fiquei satisfeita com a forma como ficou aparentemente concluído.

Também gostei bastante do destaque das mulheres na história. Esta é uma história em que a mulher é o centro de tudo. Não estou com isto a dizer que é um livro para ou de mulheres. Nada disso! Esta é uma história em que a mulher é o seu centro, em que ela tem o papel principal. Numa altura em que a mulher tinha como papel a subserviência ao marido, todas as personagens femininas são aqui retratadas como sendo elas o grande motor da história, mostrando que a mulher é mais do que aquilo que poderia aparentar naquela época. Aliás, todas as classes mais "baixas" da sociedade da época são aqui exaltadas, o que me agradou bastante.

Em relação às personagens só posso dizer que todas elas são pertinentes; todas elas são necessárias e complexas. Gostei muito de Petronella Oortman Brandt, que sofre uma modificação psicológica bastante grande ao longo da narrativa. Também gostei muito de Marin Brandt, que foi quem mais me surpreendeu, acabando por tornar-se a personagem mais complexa e cheia de um passado riquíssimo em história pessoal e ambiguidades. E claro, a personagem mais misteriosa de todas também me fascinou. No final, gostei de todas as personagens, e mesmo aquelas que se mostraram odiosas acabaram por me comover na sua história.

Esta é uma história familiar, uma história de perdão, de traição, de amor, de medo e de mistério. É uma história que podia ter acontecido e que mostra a crueldade que os sentimentos podem promover; mostra como o ódio leva ao crime, à mentira, à denuncia...mostra como o ódio só acarreta mais ódio e amargura e como é destrutivo. Mostra como os segredos e as restrições sociais muitas vezes levam à ruína e não ao bem comum de uma sociedade que vive em comunidade, mas que se destrói a si mesma com as suas hipocrisias e mentiras. Mostra como os actos têm consequências...todos eles. Mostra que, por mais que se esconda, há sempre alguém a ver, alguém a espreitar.

Enfim, é uma história singular, como nenhuma outra e que tem muito a ensinar. É uma história que nos deixa a pensar, que comove e que aflige, mas que também diverte e faz-nos sorrir. É uma bela história, que provoca quem a lê. E isso é excelente. Recomendo vivamente.

Ainda de referir a beleza estética da obra. A capa é maravilhosa, bem como todo o interior. Lindo!

NOTA (0 a 10): 9

8 comentários:

  1. eu comecei hoje a ler, ainda não tenho opinião formada, mas dá para notar que não será uma história banal.

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    1. Também senti o mesmo. Logo no início dá para ver que é uma história única, bastante singular.

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  2. Concordo em tudo contigo, Maria :)
    Excelente análise. Apesar de não ser o que esperávamos, foi uma grande leitura.

    Beijinho

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    1. Obrigada =)
      Vi que esperávamos algo mais negro. Não é, mas é muito bom.

      Beijinho

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  3. Ois miga,

    Bem parabens pela mensagem muito boa e que me deixa a suspirar por ler, espero ter oportunidade de o fazer, quem sabe seja uma das minhas compras na feira do livro :)

    Bjs e boas leituras

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    1. Olá amigo,

      muito obrigada. É mesmo um livro único, diferente de tudo o que já li. É uma lufada de ar fresco, sem dúvida.

      Espero que sim e que gostes. Pode parecer um bocadinho estranho, mas vale a pena =)

      Bjs e boas leituras!

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  4. Olá!

    Este livro tem muito boas críticas , parece ser uma boa leitura.
    Estou com bastante curiosidade.

    Beijinhos e boas leituras

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    1. Olá!

      Sim, este livro é um mimo. É uma história deveras singular =)
      Espero que leias em breve e que gostes!

      Beijinhos e boas leituras

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